segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

Espionagem telefônica

Certo dia, o missionário estava andando pelas ruas de Moscou, quando recebeu um chamado em seu celular. Era o início do século XXI, e a tecnologia havia chegado para encurtar as distâncias, facilitar a comunicação. Poucos metros depois, ainda com o celular, ele foi parado por policiais. O ato era comum naqueles tempos em Moscou, pois ainda existia o medo dos terroristas e mais ainda de
estrangeiros. Mas a abordagem tinha um motivo mais específico, o celular. Os policiais pediram ao missionário a documentação que autorizava a utilização do aparelho. Para tudo na Rússia pós-soviética se precisava de alguma autorização para seja lá o que for, herança de um regime controlador.
Os anos passaram e a tecnologia se difundiu. Em pouco tempo até crianças em jardins de infância possuíam uma daquelas maravilhas do mundo moderno. Os pesados “tijolões” foram ficando cada vez mais leves e compactos, com funções diversas, acoplando mais e mais funções e multiplicando a utilidade do celular.
Nosso primeiro celular foi um “presente” daquele missionário abordado em Moscou, e creio que o telefone do caso narrado acima possa até ter sido aquele mesmo. Num dia de neve, voltando da Faculdade, de alguma forma que não entendo até hoje, o celular caiu pelo caminho sem que fosse percebido. Acabou a era do “tijolão”. Precisaríamos comprar outro telefone e uma nova linha, uma dor de cabeça adicional às nossas vidas. Comprar uma linha era sempre um desafio, uma negociação, pois para efetuar a venda, o vendedor precisava preencher uma papelada que deveria ser repassada para algum Órgão controlador. Naqueles formulários apenas se aceitavam números de RG de um russo. Sem o número, venda proibida! Sempre precisamos achar um “laranja” para fazer isto por nós... Mas quem faria isto para um estrangeiro desconhecido?
Confesso que essa política incomodava muito, pois era como se estivéssemos sendo tolidos de nossa liberdade. Mas não para isto que aquela prática era realizada? Os anos nos mostraram que os filmes de espionagem tipo James Bond eram mais que ficção na Rússia...
Certo dia fomos convocados para uma reunião da nossa equipe, para algumas diretrizes. Realmente não me recordo delas, à exceção de uma específica. Foi-nos dito para cuidarmos o que dizíamos ao celular ou telefone residencial, pois havia a possibilidade de estarmos sendo grampeados por elementos de órgãos de vigilância. Criaram-se algumas formas alternativas de se dizer coisas, e o uso foi colocado em prática a partir daquele momento. Ligar para números suspeitos era colocar seu número na lista de pessoas potencialmente envolvidas com atividades, digamos, subversivas do ponto de vista de alguém sentado em algum gabinete. Fantasia, neurose, exagero?
Algum tempo depois, em 2010, conheci uma pessoa que frequentava uma igreja em Krasnodar. Depois de algumas conversas, sentados nos bancos da praça que ficava em frente ao Palácio do Governo do estado, ele começou a contar o que fazia antes de se tornar o responsável pelo som da igreja.
Está vendo aquele prédio ali na esquina? - apontou ele para um construção que ficava de frente para o Palácio. - Trabalhei naquela sala lá em cima, e minha função era interceptar todas as conversas de pessoas suspeitas e dos altos escalões. Muita informação passou por mim, a vida de pessoas importantes e pessoas comuns. Eu era parte de um órgão de inteligência...
- Espero que não faça mais parte disto – respondi amigavelmente, mas colocando mentalmente a conversa na categoria de “perigosa”. - Ainda funciona algo lá?
Apenas um olhar de canto em minha direção foi sua resposta. Mudamos de assunto...
Certo dia recebemos uma ligação, daquelas que ao atender não se ouve uma resposta ao nosso “Alo!”. Daquele dia em diante isto começou a ocorrer com mais frequência. Notamos que quando falávamos ao telefone com outras pessoas, havia alguém “no fundo”. Algumas vezes as conversas eram entrecortadas com outra no fundo. Alertados com toda aquela conversa sobre grampeamento, começamos a suspeitar de algo. Conversamos depois de um tempo com o dono do apartamento a fim de solucionar o “problema”. Ele prometeu fazer algumas ligações e resolver tudo. Daquele dia em diante, mais nada ocorreu, que soubéssemos. Bem, tudo poderia ser um problema com a linha mesmo, mas naquele momento de tensão sobre espionagem, quem duvidaria?
Nunca soubemos o que na realidade fazia o dono de nosso apartamento. O pai dele era um oficial da polícia aposentado, daqueles muito espertos, em todos os sentidos. O filho trabalhava em algum Órgão de informação do Governo, com constantes idas até Moscou. Em todos os anos que passamos lá, jamais conseguimos saber qual era a função dele.
Tudo isto nos leva a refletir sobre o quão seguros podemos estar neste mundo. Estamos numa luta que transcende as esferas naturais, adentrando por dimensões que estão fora de nosso controle. Aqui não temos qualquer conhecimento, segurança. Podemos apenas confiar nas palavras de Cristo, e no poder do seu maravilhoso Nome. Sem ele, estamos desarmados, cercados por forças contra as quais não temos chances de vencer. Somos controlados, vigiados e introduzidos em batalhas contra essas forças.
Quão poderosas são as palavras do apóstolo Pedro: “Sejam sóbrios e vigiem. O diabo, o inimigo de vocês, anda ao redor como leão, rugindo e procurando a quem possa devorar. Resistam-lhe, permanecendo firmes na fé, sabendo que os irmãos que vocês têm em todo o mundo estão passando pelos mesmos sofrimentos.1 Pedro 5:8-9


Leialdo


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